quarta-feira, 25 de outubro de 2017

agora que nos encontramos, nunca mais nos vamos perder!

Há sempre opção de viver em realidades distorcidas. Como pode doer optamos por não procurar saber o que sentimos. Porque pode parecer bizarro, procuramos evitar pensar. Desconforto. Odeio desconforto. Depois dizemos em meias palavras. Passamos a inteiras. De repente estamos a explicar-nos. Em voz alta. No espelho. No chat. Verbalizamos com pessoas. Esperamos 3 dias. São necessários 3 dias para ver o mundo direito depois de ter estado ao contrário: Aí está! Na sua na forma original. Passou. Respira. Tens as vias respiratórias abertas. És um pássaro. Novamente. Sente-te! Passou. Aquela bola de pêlo que incomodava tanto o pensar. Tossimos. Aliviou. Já não está irritado, o alter-ego. Parece que foi ao terceiro dia que Ele sacudiu a água do capote. 
E alguém me diz em forma de calor: «E precisamos tanto de conversar! Precisávamos de fazer uma viagem de comboio, daquelas que se faziam antigamente, muito longas, em que se gastavam treze horas num percurso de trezentos quilómetros. Mas nem isso chegava… Precisávamos, sim, era de ir de comboio através de toda a Europa, de toda a Ásia, até Pequim ou Vladivostok. E pernoitar em todas as estalagens que já não existem. Ficarmos a conversar ao canto do fogo, durante a noite, e viajar continuamente durante o dia.»
Eu sei que o amor tem formas. Esta tem forma de sol de inverno. Quentinho. Nas pontinhas dos pés. De olhos fechados. Manta. E finos. Como tem de ser.

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

The wonderings are never ending

That's it. Já está. Já foi. Já recomecei. Pensei um pouquinho. Caí dois ou três minutos na melancolia. Não estou no sítio onde que queria estar. Não sou quem queria ser. Sou Eu. Só. Como vi há uns dias num documentário (“Silverlake Life: The View from Here”). Somos como vivemos. Se vivemos ansiosos. Somos ansiosos. Se vivemos com pessimismo. Somos pessimistas. Se vivemos de olhos fechados. Somos cegos.
Conclui que é melhor ser alegre do que ser triste, como diz o doce Vinicius Moraes. Porque se vivemos com alegria. Somos alegres. E viver com ansias do que devia ou podia ser Eu... não compensa.
E eu não sei se o mundo anseia o sopro do meu coração. Mas sei que quando abraços me aquecem o peito. Quando beijos cantam afinados na minha cara. Quando ouço o meu nome entre sorrisos e dentes. É quando sei que compensa. Compensa dançar o mundo. Cantar piroso e desafinado por todo lado. Cantar bocadinho de músicas que nunca ninguém ouviu ou ainda é cedo para ouvir. Defender ideias e ter respostas. Compensa não ficar no sofá. Compensa assustar com a energia toda. Compensa ser chamada de intensa. Assustar. Sussurrar aos ouvidos atentos que sou cordeiro em pele de rebelde. 
Compensa o dia de cada vez, sem ser para a vida toda. Compensa ser curiosa. Pelo Mundo. Por Mim. E no meio de tanto cálculo e pesos. No meio de tanta mania de balançar e equilibrar-me nas pontas, nos meios e nos fins. Compensa ser o que Sou. Se somos como vivemos, e se vivermos tudo, é sermos cheios?

sexta-feira, 8 de setembro de 2017

You Only Live Once

Foi uma viagem que parecia uma espécie de sonho. Às vezes parecia que não estava acontecer. Outras podia jurar que podia passar a minha vida naquilo. 10 dias. Sol. Areia no corpo. Sal no cabelo. Poncha e água ardente. Chão feito de lava. E YOLO, muito YOLO.
Uns dias antes da partida tive receios. 30 pessoas. Faixas etárias aleatórias. Personalidades descompensadas. Graus de loucura variados. A acrescentar: atuações. Causam sempre as quezílias do costume.  
Dez dias depois. Depois do cansaço apoderar-se do corpo. Das nódoas negras (causadas pelo caiaque) ganharem expressão. Fazem-me falta os pequenos almoços de tabuleiro. Faz-me falta a "alvorada que nasce na serra". Faz-me falta o "chão é lava!" acompanhado por risinhos e gritos estridentes. Faz-me falta o "migos" e a pronuncia de Sistelo. Fazem-me falta as fotos de risos rasgados. Fazem-me falta os esses das noites de poncha e água ardente. Faz-me falta a plataforma e os Lonely Island. Das vozes e das meninas de Braga. Dos meus filhos adoptivos. Dos laços criados. Das caminhadas lado a lado. Fazem-me falta os olhares trocados e a cumplicidade que nos enche o coração sempre que olhamos as fotos.
Memórias que fazem vibrar o whatsapp... felices los 4!
Foi uma viagem que parecia uma espécie de sonho. Podia jurar que podia fazer disto vida!

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Podia ser pior

Naquelas alturas que a minha cabeça começa a estalar por não poder processar tudo o que me acontece começo a falar sozinha. A ter diálogos de conteúdo dramático com uma personagem qualquer que preciso de inventar. Normalmente é um homem, bonito, de aspecto hollywoodesco e no qual defino uma personalidade amena, que me agrade. O homem da minha vida. Mas impossível, quase platónico. Como todas os casos amorosos que experienciei ate hoje. Conto-lhe o que não entendo. Abro-lhe o meu coração e muitas vezes choro pela injustiça que sinto em ser diferente das outras mulheres. Nunca entendo porque me sinto diferente e tantas vezes inferiorizada. É um sentimento meu, parvo porque lá no fundo só tenho dramas triviais e básicos. 
Ele normalmente percebe-me, ou apenas só me ouve lamentar. Creio que em tempos substitui esta personagem masculina, bonita e atraente por dois irmãos que nunca conheci, e na minha imaginação de criança sempre me acompanharam. Nunca os neguei. Sempre achei que de facto me acompanhavam. São uma espécie de anjos-da-guarda que sabem que vou sempre muito sozinha. Numa suposição minha que eles entendem, por isso me acompanham. 
A verdade que estes amigos imaginários numa mulher de 30 anos fazem-me parecer mais louca do que gosto de o ser. Mas eles, estas figuras masculinas sempre foram presentes em momentos de desequilíbrios emocionais. E na verdade sempre tive muitas rejeições e uma vida amorosa muito à base da faca nas costas, de adaga no coração, de garfos espetados nos olhos e muita self pity. E como a maioria das pessoas me vê forte porque eu imponho muitas vezes a mim mesma essa imagem de pilar do Egipto. Sempre munida de humor e risos rasgados. Uma farcinha para uma sociedade que não acredita em fado, fui-me tornando calada nestas coisas. Passei a ter amigos imaginários a quem conto o que correu mal e eles ouvem-me. Eu ainda termino a conversa a dizer como me vou levantar do chão e tornar-me mais forte. Sozinha. 

Passei muito tempo sem eles, desde o abismo "João", andei muito ocupada com hobbies que estes fantasminhas desapareceram. 
Mas. Nestes últimos tempos, desde que regressei de Santiago precisei de voltar a falar sozinha. De processar dúvidas e assuntos. Porque, mais uma vez, me senti diferente das outras mulheres. Voltei à realidade de todos me conhecerem. De fazerem perguntas que eu não sei responder.
Como não me posso queixar sempre do mesmo tive de criar pequenos diálogos sobre: sim continuo solteira. Pois, não sei. Creio que não há volta a dar. Sim. Sou forte. Não faz mal. Só tenho é de gostar de mim. Sim. Os homens não prestam. Estou bem assim. Encontrei um equilíbrio. Eu sou assim, diferente.
Na semana passada, já o meu sexto sentido apitava há meses... o inevitável aconteceu. Ela precisa de se afastar porque gosta de mim, de outra forma. Eu mais uma vez, para não chatear muito ninguém ou porque não quero falar muito sobre o assunto. É estranho. Voltei a falar sozinha. O meu homem hollywoodesco  disse-me que vai ficar tudo bem. Porque sabe que desde que eu fui a cabo verde desenvolvi mais uma escotilha no subconsciente sobre "não me posso queixar e podia ser pior". 
Dei-me conta desde que regressei que sempre alguma coisa me corre menos bem eu penso: podia ser pior. Podia não ter um braço. Podia não ter uma mão ou ainda, podia ser uma criança em África sem nada para comer. 
Às vezes acho que estou a dar o tilt. Mas não. Estou longe disso porque criei ferramentas para o evitar. Sempre fui uma criança, adolescente, mulher diferente. De ideias pouco ortodoxas? Talvez. 
Só criei um mundo onde não estou sozinha, mesmo que a sociedade o dite. E na verdade, podia ser pior!


terça-feira, 11 de julho de 2017

Voltei

Voltei. Não foram três meses. Nem quatro. Foram seis meses. Meio ano em 30 e quase 1 anos, são 1.61% da minha vida. Parece muito mais. Claro está que o tempo e a sua capacidade de diluir coisas fará a sua parte de acalmar a saudade e dar-lhe um toque doce.
Aprendi no Erasmus que temos de estar agradecidos por ter acontecido. Por termos vivido "pessoas" novas. De sermos mais ricos. Sou e estou mais rica. Vou aos poucos tendo pequenas prateleiras de felicidade no coração. Santiago foi muito doce comigo. Quebrei barreiras de preconceito. Quebrei ideais parvos. Criei laços. Partilhei sorrisos e abraços. Senti que ser português é especial. Juro. Somos especiais. Senti que sou cada vez mais das pessoas. Sou a menina das pessoas. Senti que sou a uma princesita naquele laboratório.
Voltei mais menina. Cheia de mimo. Mais certa de que ser feliz tem de ser simples. Que pode caber nas nossas mãos. Nos nossos abraços. Nos sorrisos e nos olhares. Que cabe em nós de forma serena. Todos os dias. Por isso voltei assim. Peculiar..

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Galegos

Santiago tem sido boa comigo. Tranquila. No laboratório o ambiente é bom! Louco, bem à moda espanhola. Vou sentir falta. É o melhor ambiente de laboratório que já estive. Sinto-me acolhida.
Talvez pela a língua ser quase a mesma. Os Galegos são bem parecidos com os portugueses, não há como nega-lo. Talvez nós sejamos uma continuação deles, nos tempos modernos. Ás vezes acho-os mais reservados e nós mais conservadores.
Por faltar um mês vou caminhando pelas ruas com alguma nostalgia, vou apreciando gestos no laboratório que vou sentir falta.
Acho que vivi pouco a cidade, mas ao mesmo tempo tenho a sensação de pertencer aqui, de uma forma natural. Como se também esta fosse a minha casa. Consigo ser a mesma pessoa. A facilidade com que estou em Portugal é provavelmente a maior razão para sempre me sentir em casa.
Tem sido uma grande experiência. Uma experiência de relações. De ser capaz de entrar num carro de boleias com estranhos. Estranhos que durante duas horas são apontamentos na minha vida. De fazer amizades nessas boleias.  De ser capaz de viver sozinha de forma simples, sem grandes dramas. De ter aprendido a dormir a cesta. De apreciar beber café com leite. De almoçar às 15h e jantar às 22h. De pinchar tortilla e beber Estrella Galicia. De gostar de espanhóis e perceber que afinal de Espanha pode vir bom vento.
Falta saber se saco um artigo daqui. A química é tramada.
Deixar o trabalho para último implica que o meu pai me ensinou bem: "Trabalhar para viver, em vez de viver para trabalhar".
Falta um mês e eu tenho caminhado em terrenos bons! Em Terrenos galegos!

segunda-feira, 20 de março de 2017

pedra bela

É um eterno bloqueio. E é como se eu não conseguisse controlar porque é controlado. Eu não entendo a razão. O porquê. E fico assim, estranha. Com uma dorzinha no peito. Com alguma melancolia. Insegura sobre o que pensar. O que sentir. Se devo apenas aceitar que não é nada. Que foi um passeio. Ponto. Fico confusa. Confusa e de mau humor. 
O melhor é aceitar que é assim. Que alinha do meu horizonte não se vê. Que vou ser diferente. Como se fosse paralímpica. E sendo-o, tenho de aceitar as minhas limitações sem me desfazer em pensamentos negativos de "self pity". 
Hoje tenho os dois pés num buraco negro porque eu própria os pus lá. We never change!
 

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

ser passageiro

A curto, médio ou longo prazo somos passageiros de viagem na vida de muitas pessoas. O número é grande e se fechar os olhos e pensar quantas vidas tocaram na minha e em quantas toquei eu... aparecem-me muitos dígitos, como se fosse o tio patinhas. 
De algumas nem da cara guardei memória. Nem do tom de voz. Foram tão breves os instantes. Um olá. Uma conversa de elevador. Um sorriso de cordialidade. Algumas ficaram porque me olharam. E o olhar delas ficou-me. Outras ficaram tanto em mim que ainda sei o perfume que usavam. A risada, a forma de andar ou o que diriam em determinadas situações. Na verdade foram horas. Ou dias. Ou anos que partilhei com elas. As (provavelmente) mais interessantes, ficaram e são passageiros de lugar cativo.

Deixar as pessoas sentarem-se no banco das nossas vidas. Ajeitarem as costas no assento e cruzarem a perna. Trocar olhares, gestos e palavras connosco é umas das coisas que mais gosto. Ideias. Conhecimento. Sentimentos... mas desde que me mudei para Santiago, pelo que vou percebendo, é cada vez mais difícil. Tanto que sinto desconforto em algumas situações. 
E sempre que penso nisto (todos os dias ao almoço) nunca consigo deixar de comparar como foi na Bélgica. E depois de comparar, percebo que sou eu que estou diferente.

Nas boleias que tenho partilhado tenho mantido conversas interessantes. Conheci pessoas que poderiam facilmente ser minhas companheiras de viagem a longo prazo. Amigos. Mas nunca fiz esforços para ficar no banco delas, ou elas no meu.  Tenho só saído agrada da viagem. Como se aquelas duas horas dentro de um carro estranho tivessem valido a pena. Como a sensação de ler capitulo de um bom livro. Rápido e justo.
Há uns dias, numa dessas viagens, isso mudou. Conheci 4 pessoas aborrecidas. Acho que aborrecidas com elas mesmas, sem o saberem. 
Tocaram a minha vida para perceber que não seriam passageiras na minha viagem.

No laboratório tem sido diferente. Tem sido um misto de sensações. Ás vezes sinto-me insegura. Outras é fácil rir e conversar. Quero baixar a guarda e sentar nas cadeiras que existem.. mas parece que não são do meu tamanho... ainda. Ao mesmo tempo tento deixar sentar na minha cadeira de viagem. No meu banco. Estamos todos a testar tamanhos que nos servem. Marcas que queremos deixar. Sair da zona de conforto. Trocar olhares que nos ficam. Temos de sair da zona de conforto e ser passageiros na vida dos outros.



quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Cabo verde - Santiago - Santa Cruz - Pedra Badejo

Foram dez dias de paisagens às quais não consegui associar nenhuma outra. Terra árida e pobre. Picos e montanhas, secos e poeirentos. Plantas magras, de tronco escuro, com a copa verde e folhas firmes. Um pouco como a gente dessa terra. Magra, pobre mas de cabeça erguida e alegre. Trouxe uma mixórdia de sentimentos. Não sei como separa-los nem dizer qual pesa mais. De um lado a alegria de ter estado lá. Ter partilhado histórias. Cultura. Sorrisos e abraços. De ultrapassar a barreira do Crioulo. De o afecto prevalecer no olhar de todos.
Carrego no peito admiração por pessoas simples que dançavam, cantavam e batiam com as mãos e braços fortes em batuques. Que elevavam a alma ao som da batucada cabo-verdiana.
Na outra mão tenho desconforto em saber que ainda existem mulheres escravizadas por homens maus. Que abusam dos sonhos delas. Trago a tristeza de ver pobreza na alma e na vontade. Mais do que não ter tecto, não ter vidros, não ter água quente é ter uma alma pobre. Trago tristeza de não ver horizonte para tantas crianças. Horizonte para mães adolescentes. Para tanta gente. 
Trago o sentimento de que não me posso queixar de mais nada. Sei que isto se vai diluir nos dias. Que vou deixar de o sentir tão presente como agora. Mas quero que fique guardado em mim, para que nunca me queixe que a minha vida não é perfeita. É! A nossa vida é simplesmente fácil e perfeita. Vi-o nos olhares que se cruzaram com o meu. Esses olhos sorriam-me, viam o quanto a nossa vida é fácil. O quanto é perfeita!
Trouxe ainda no coração uma irmã. Pequenina de 1.75m. Frágil e doce. Forte e assertiva. Trouxe a J. Doce e pequenina. Que vai ser grande. Maior! 
Trago a certeza de ter uma afilhada incrível. Com um coração tão grande, como nunca vi. Forte. Lutadora. Bonita. Simples. Que canta, que encanta.  Uma C. que é do mundo e o mundo é melhor com ela.
O resto já o sabia. Os risos imensos do A. que me divertem de uma forma simples e natural. Pragmático e descomplicado. A calma do N. Paciente e inteligente. A perspicácia dele é encantadora. Nos silêncios é capaz de dizer com o olhar tudo com tamanha clareza. É um dom. 
Ás vezes penso como as nossas vidas se cruzaram. Como as nossas idades diferem e somos tão bom juntos. Penso como a minha vida ficou mais rica. O quanto eu sou mais feliz com amizades improváveis. 
Venho de coração cheio. Venho com calor no coração. É um inverno quente que me vai confortar durante muito tempo. Venho com a alma cheia de mar e sorrisos.

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

shiuuuu

Silêncio. Têm sido dias de silêncio. Quando penso no silêncio, penso que gosto dele. De nós. Eu e ele. E pensado bem, não sou pessoa de muitos silêncios. Mas ele não me incomoda. Normalmente canto quando estou rodeada dele. Canto lengalengas. Não ligo a televisão quando chego a casa porque gosto de estar “acompanhada". Até gosto de chegar a casa e ter silêncio. Se estiver cansada do silêncio gosto mais de ligar o rádio. Mas nem sempre me lembro. Ou nem sempre tenho vontade. Ou canto sozinha, para o silêncio. Ou estou só a fazer coisas em silêncio. Eu e ele. Ou só eu. As pessoas vêm como uma pessoa cheia de barulhos. Falo e riu alto. Canto alto. Penso alto. Resmungo alto. Dou muitas opiniões. Sempre do alto. Às vezes do meu pedestal. Há quem me chame snob. Juro que é mais forte que eu. Não gosto de o ser. Há barulho em mim. As pessoas vêm barulho em mim. Santiago tem sido silencioso. Viver sozinha assustava as pessoas que me rodeiam. Assustava-me a mim. Mas ao mesmo tempo era como se o silêncio me chamasse. Viver com os pais. Ter folclore à terça-feira, jazz e ballet à quinta-feira, a catequese ao sábado, GMP ao domingo... e todas as reuniões e atuações que advinham das mil atividades que vivia. Sim. A minha semana era barulhenta. Às vezes, quando ficava sozinha, ficava inquieta por me ser estranho e aliviada por ser preciso. Nestes últimos dia há muitos silêncios. Sou eu e a casa. Ou só eu. Não me custa. Às vezes canto. Às vezes ligo a TV. Às vezes leio ou falo por mensagem, no silêncio. Eu e ele. O silêncio. Ou só eu. Somos um!

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

O Caminho faz-se caminhando

Mudei-me. 
Estou bem. Não estranhei a cidade. É verdadeiramente estranho como me sinto bem aqui. Lembro-me do choque que foi Gent no dia que cheguei. Na semana seguinte e durante o primeiro mês. Era tudo estranho. A língua. A postura dos Belgas. Calados e sérios. O corpo deles. Muito altos. As bicicletas por todo o lado. Neve. Muitos árabes. Era tudo diferente da aldeia de onde eu vinha. Sentia-me sempre desconfiada. Ainda corri algumas vezes de pessoas que me tentavam abordar. 
7 meses depois, no dia que tive de voltar, chorei. Chorei muito. Adorava as pessoas que viviam e conviviam comigo. Adorava a cidade. As bicicletas. A cerveja. O pão dos árabes, e a galinha assada deles... e até a forma estranha de me olharem.
Passaram quase seis anos desde então. Estive em terreno seguro. Estive na zona de conforto, de cabeça enfiada no melhor que a minha terra tinha para oferecer. Estive sempre muito mimada e aconchegada. Cresci muito. Aprendi a ser mais simples. Aprendi a gostar das coisas como são. 
Mudei. Mudei-me. Mudaram-me.
Agora é tempo do el Camino. Santiago de Compostela, a 200 km de casa, um pulinho.. é o que dizem. À primeira vista tudo me parece igual. Sinto-me igual. A cidade é bonita. Caminho todos os dias 20 minutos entre o centro histórico e um jardim. Mui bonito o passeio. Tranquilo. Percebo a língua sem grande esforço mental e as pessoas parecem-me mais familiares. Os galegos são simpáticos, de sorriso grande. Sinto o meu corpo mais relaxado. Sem desconfianças. Sinto-me um pouco em casa. Não tenho muito aquele drama de quem se muda. De estar muito sozinha. De não conhecer ninguém. Sinto que vai ser mais fácil que na Bélgica. Tento sorrir e mostrar-me acessível. Faço "fingers crossed" para me convidarem para almoçar ou uma cerveja pós-laboral. Na Bélgica levou quase um mês, vamos lá ver como se saem os Espanhóis.
"Caminante, no hay camino, se hace camino al andar.", Antonio Machado