domingo, 28 de abril de 2013

Fado cravo

Não é sempre verdade que me sinto resolvida. Não é certo o rumo que quero tomar. Não é mentira que procuro uma saída, sem na verdade acreditar que me resolva, que me encaminhe e me faça parar de procurar. 

Não sei por que agrado, 
Enche-se de lágrimas 
Meu olhar parado. 

Recordo outro ouvir-te, 
Não sei se te ouvi 
Nessa minha infância 
Que me lembra em ti. 

Com que ânsia tão raiva 
Quero aquele outrora! 
E eu era feliz? Não sei: 
Fui-o outrora agora. 

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

segunda-feira, 22 de abril de 2013

floating on a tidal wave

Sonhei com o R. a gritar. Estava de t-shirt vermelha e ar zangado. Foi apenas isto que retive do sonho. Havia ira açoriana, havia razão. 
Acho que por me ter esquecido do aniversário dele no dia 16, fiquei com um peso na consciência e ontem extravasou para o sonho. O meu inconsciente precisou de massacrar o consciente com a falta de consideração que foi o meu esquecimento. 
Ele mostrou-me Lisboa, deu-me tecto e foi meu amigo, e eu em seis meses esqueci, esqueci o aniversário dele. Não é bonito, eu sei senhor grilo falante, não é nada bonito. A verdade é que perdemos o rumo um do outro e não soubemos querer ser amigos. Ás vezes não podemos atar pontas soltas. Com ele as pontas soltas eram mais felizes do que as agora atadas. 

domingo, 21 de abril de 2013

Tenho tanto sentimento

«As coisas fazem-se sem expectativas, não é sempre certo que o abrir da janela revele um dia se sol. Habituá-mo-nos a esperar por dias melhores, por pessoas melhoras... por sol. Então sentá-mo-nos nos dias e vamos relativizando. Ocupá-mo-nos com coisas mais importantes ou com pequenos nadas, como estender ao sol a ler. Criar laços com nós mesmos e sabermos suportar a nossa própria companhia sem nos sentir-mo-nos sós é o chamado, Ser moderno. 
Ela habituou-se a noites com séries, filmes e livros. A sábados entre crianças e bolos. A domingos de descanso, ora ao sol em dias quentes, ora a dormir entre cobertores em dias frios. Aprendeu a dar valor a quem sempre pode à sexta-feira estar com ela e a quem ao sábado precisa de a ouvir. Sabe-o muito bem e entende que seja preciso ter isso com amigos e aprendeu a não pedir mais a quem não pensa retribuir. Sim, sente agora que muitos só sabem receber e nada apreenderam sobre "dar" mas já não se chateia. Gosta de ouvir o rio, gosta de ouvir o mar. Gosta de música e de ouvir fados, de histórias e vidas. Gosta de ouvir risos, gosta de sol, praia e de trilhos. Gosta da família e do amor fácil. Gosta de ser forte e prática. Gosta de escrever, de ler, de falar da alma, de exagerar e dramatizar... Gosta de dizer que "gosta" e gosta de sentimentos:

Tenho tanto sentimento 
Que é frequente persuadir-me 
De que sou sentimental, 
Mas reconheço, ao medir-me, 
Que tudo isso é pensamento, 
Que não senti afinal. 

Temos, todos que vivemos, 
Uma vida que é vivida 
E outra vida que é pensada, 
E a única vida que temos 
É essa que é dividida 
Entre a verdadeira e a errada. 

Qual porém é a verdadeira 
E qual errada, ninguém 
Nos saberá explicar; 
E vivemos de maneira 
Que a vida que a gente tem 
É a que tem que pensar. 

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Shame on you!

Massagem de corpo inteiro:

- uuuu (gritinho de fazer inveja quando se fala com as amigas) vou fazer uma massagem de corpo inteiro! Já me estou a imaginar super mega relaxada. A vida é bela! - disse eu.

Freckles vai ao spa. Tem dificuldade em encontrar aquilo. Stressa e dá mais 3 voltas ao quarteirão. Estaciona finalmente e bufa! 
Entra e pensa «vou relaxar tanto que nada importa».

- A menina já vai entrar, aguarde por favor - diz simpaticamente a jovem que está sentada atrás de um balcão em forma de espreguiçadeira chic.
Sentei-me num sofá que me afundou de tão confortável que era. Sorri.
.
.
.
- É a menina Freckles? - diz-me um homem
Tremi, «mau mau mau, diz-lhe que não!».
- Sim - disse eu a medo e com expressão de desconforto.
- Venha comigo, por favor, vamos lá fazer a massagem.Corpo inteiro, não é?
«Nãoooooooo! É gay, é gay, é gay!» gritava eu mentalmente. Depois disse-me para ficar em langerie e que voltaria num instante.
Pensei em fugir! 
Respirei. Mudei de estratégia e comecei a tentar convencer-me que ele era um profissional, que não teria pensamentos impuros nem ia julgar nada neste corpinho!

Um hora depois, saí menos relaxada que a expectativa inicial, mais envergonhada (era um homem não consegui evitar não ter preconceito) e mais chateada por ter duvidado do profissionalismo dele (por ele ter nascido homem, e por escolher uma profissão que eu como mãe dele não aprovaria).

Não olhei uma vez directamente para a cara dele, só para nunca o reconhecer na rua, que vergonha!

Ora o senhor foi muito cuidadoso e claramente percebeu que era uma provinciana!

Shame on you, Freckles! Shame on you!

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Time

«Enquanto os cheiros da manhã a despertavam, olhou-se no retrovisor, fechou a janela do carro, esperou pelo verde e suspirou. Naquele suspiro limpou a alma:
 Já não pensa em pilotar aviões ou mesmo saltar deles. Já não pensa em trazer a espada à cinta e usa-la em gargantas que pensam em enfrenta-la. Já não tem intenções de usar pala, nem de nadar com apenas um braço para salvar a sua obra. Desistiu de atravessar a muralha da China a pé, já só admite sair do carro e pisá-la com força e seguir viagem. Domar leões de chicote e turbante na cabeça já não é hipótese e  ir ao circo ver fazê-lo ainda menos. Já não tem tempo para idealiza-lo, o mundo e ela.Tem usado cada vez menos o coração... Já não tem tempo para ele."

domingo, 14 de abril de 2013

Cabedelo


"The summer windCame blowin' In from across the sea, It lingered there To to touch your hair (...)" 


Quente, frio, vento e brisa e muita areia no ar. Estava bom. O Cabedelo é assim, é a minha praia. Foi a primeira praia, a grande paixão de areia fina, de vento norte e frio, de manhãs de praia e tarde na rede a ler e a dormir. A minha mãe Pi conta que levou-me à praia com apenas 2 meses, é aquela a praia, a nossa, e dali só arredamos pé nas férias de 98. Apesar de já não lá fazermos férias como antes, somos apaixonados. Montávamos ferro em Abril e levantávamos em Setembro. Até Ao fim do mês de Setembro todos os bocadinhos que haviam: fins de semana, feriados e mini-férias ou mesmo férias "grandes", lá estávamos nós. Havia risos, havia muita felicidade nesses dias. Ainda hoje passamos uma semana lá, a semana das festa de Viana, para relembrar. Acho que é o reconforto que sentimos e que nos faz lá voltar. 
Hoje, no primeiro dia de sol quente que tanto ansiamos, foi brindado com a alegria de voltar a ver o céu azul e o mar meigo na areia branca, que em silêncio me faz sorrir. Foi ali que aprendemos a sonhar!



quarta-feira, 10 de abril de 2013

True

"Everybody is looking for somebody else, until they settle for the person they're with!" @ Tyler, Men at Work, season 2


segunda-feira, 8 de abril de 2013

Rugas

Chovia, melhor dizendo chuviscava e eu vinha embalada na estrada escura e brilhante quando nela reflectiam as luzes dos carros que se cruzavam comigo.
Ligava eu o limpa-para-brisas quando os chuviscos me incomodavam e pensava no meu dia, no meu fim de semana, neste e naquele, em sorrisos e palavras, ausências e silêncios quando dei comigo a balançar-me deliciada. Inclinava a cabeça com a melodia e punha o ouvido a jeito como estivesse lá, no clube de Jazz de Gant, só mais uma vez. Ali, naquela nuvem mágica amarela e cinzenta dos pequenos nevoeiros dos cigarros que todos fumavam. Balançando-me uma vez mais de olhos semicerrados  quase a levitar de tão bom que soava aquela música a tocar tão perto de mim.

Voltei quando uma voz rouca interrompeu dizendo: Jazz a dois!

Olhei para o visor e nele vi escrito «Antena2». Respirei fundo, estava descansada, (quem faz exercício não fica cansado, mas descansado), olhei a estrada e estranhei-me. Pensei: «Estou velha! Passei o limite, depois de uma aula de hidroginástica em que a média de idades dos alunos rondava os 55 anos e jacuzzi, estou derretida a ouvir Jazz! Daqui a nada tenho uma garrafa de água quente nos pés e o chá a fumegar enquanto vejo a novela».







Running

Foi um fim de semana bom! Bom mesmo! Cheio de cor, de conversas, de Salsa e Merengue.
Foi estar entre amigos e vê-los de mais perto, mesmo de longe. Foi sentir a estranheza de olhar em volta e sentir que já não gatinho.

Andei nervosa, roedora de unhas e armada em croquete em noites mal dormidas, por nada. Talvez o trabalho me aflija mais do que eu gostava. Os dias a passar e tanto por fazer, dão-me nos nervos.

Entrei na aventura de sábado de pé atrás. Acho que sou como a minha mãe, não gosto de dar passos assim: dormir aqui e ali, sem conhecer, sem sentir aquele bocadinho de confiança que me é precisa e com amigos ás vezes menos amigos, mas lancei-me. Fui! Sorriso amarelo a medo e de passo entre passo, deixei-me envolver no ambiente familiar, no aconchego que se vê e sente em todos os cantos e...relaxei! Relaxei de tal forma que depois foi sempre a sorrir...fazia-me falta esse sossego, essa coisa que se deu, já algum tempo que não me sentia assim.