«As coisas fazem-se sem expectativas, não é sempre certo que o abrir da janela revele um dia se sol. Habituá-mo-nos a esperar por dias melhores, por pessoas melhoras... por sol. Então sentá-mo-nos nos dias e vamos relativizando. Ocupá-mo-nos com coisas mais importantes ou com pequenos nadas, como estender ao sol a ler. Criar laços com nós mesmos e sabermos suportar a nossa própria companhia sem nos sentir-mo-nos sós é o chamado, Ser moderno.
Ela habituou-se a noites com séries, filmes e livros. A sábados entre crianças e bolos. A domingos de descanso, ora ao sol em dias quentes, ora a dormir entre cobertores em dias frios. Aprendeu a dar valor a quem sempre pode à sexta-feira estar com ela e a quem ao sábado precisa de a ouvir. Sabe-o muito bem e entende que seja preciso ter isso com amigos e aprendeu a não pedir mais a quem não pensa retribuir. Sim, sente agora que muitos só sabem receber e nada apreenderam sobre "dar" mas já não se chateia. Gosta de ouvir o rio, gosta de ouvir o mar. Gosta de música e de ouvir fados, de histórias e vidas. Gosta de ouvir risos, gosta de sol, praia e de trilhos. Gosta da família e do amor fácil. Gosta de ser forte e prática. Gosta de escrever, de ler, de falar da alma, de exagerar e dramatizar... Gosta de dizer que "gosta" e gosta de sentimentos:
Tenho tanto sentimento
Que é frequente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.
Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"
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